“As novenas” de Azeitão
O Dr. Jorge Maria de Carvalho pediu-me que escrevesse algo sobre este assunto. Faço-o com todo o gosto dando assim o meu contributo de memória na celebração do 400º aniversário da Santa Casa da Misericórdia de Azeitão.
As “novenas”, como o povo de Azeitão tão carinhosa e reverentemente lhe chama e como se sabe, são uma referência histórica e uma vivência da piedade popular dos azeitonenses. Em 1 de Novembro de 1755 – o Terramoto, apesar das terríveis destruições em Lisboa e arredor, poupou a Vila de Azeitão de tão grande hecatombe. E isto porque esse bom povo, aflito, fez
preces e se socorreu da imagem secular do Senhor dos Passos para pedir ao céu protecção e misericórdia. A partir daí sempre houve em Azeitão gratidão ao Senhor Jesus por tão grande prodígio.
E essa gratidão concretizou-se através dos séculos, em organizar anualmente as “novenas”, a começar em 23 de Outubro de cada ano e a culminar no fim de nove dias, na Missa Solene de Acção de Graças, em dia de Todos os Santos, seguida de procissão majestosa pelas ruas do burgo.
Os padres franciscanos fomos chamados para, com a aquiescência dos párocos, orientarmos os conteúdos catequéticos das pregações e a devoção popular relacionada com o mistério de Cristo, o Senhor dos Passos. De notar que até as crianças acorriam, ao longo dos muitos anos em que orientei as “novenas”, aos ensinamentos da catequese. E ainda hoje encontro homens e mulheres de Azeitão que me repetem nas ruas esta ou aquela história que contei há quase quarenta anos atrás.
É importante frizar que as “novenas” a pouco e pouco ganharam a forma sociológica da “festa” de Azeitão. É claro que os mais críticos confrontam o sofrimento que transparece da imagem do Senhor dos Passos com o ar festivo e de convívio que as famílias deixam transparecer ao juntarem os seus membros, alguns vindos de longe para a festa do seu convívio. Mas em minha opinião essa posição desses críticos só existe porque não sabem adequar a fé, a religiosidade ao fenómeno sociológico do encontro do povo em alegria e grande festa.
Resta-me deixar aqui um repto aos vindouros para que não deixem morrer esta devoção popular antiquíssima. Estou certo que o atual Provedor da Santa Casa da Misericórdia e seus sucessores continuarão a dar-lhe expressão com o querer da Paróquia e outras forças vivas de Azeitão.